terça-feira, 4 de maio de 2010

O COTIDIANO DA ESCOLA: EDUCAÇÃO AFRO-DESCENDENTE NAS ESCOLAS BÁSICAS DE SANTARÉM

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Francisca Canindé B. dos Santos1
Fabrine dos Santos Rodrigues2
Wilverson Rodrigo Silva de Melo1
E-mail: francisca.caninde@bol.com.br

RESUMO - O presente estudo é resultado de uma pesquisa em andamento, cuja temática envolve o título
acima. Os objetivos que permeiam as discussões a respeito da educação dos afro-descendentes poderão mostrar a
realidade até então desconhecida. Neste caso, é necessário observar as vivências e comportamentos que ainda
podem estar recheados de preconceitos, discriminações, estigmas, que certamente ferem a dignidade dos
estudantes em desenvolvimento. Para tanto, estamos utilizando o método indutivo, a fim de descobrir, tanto
comportamentos docentes e discentes na sala de aula e fora dela. A coleta de dados está se processando através
da observação direta, entrevistas com os atores já mencionados, para que possamos através do método
comparativo e histórico encontrar resultados que possibilitem análises e discussões que respondam os objetivos
propostos, no sentido de contribuir com as escolas e seus professores, que poderão rever seus projetos e colocar
em prática a Lei 10.639.

PALAVRAS-CHAVE: afro-descendentes, discriminações, educação

INTRODUÇÃO - A sociedade brasileira não difere das demais sociedades do mundo de
modo geral. Ela é excludente, a divisão de classes justifica comportamentos que ferem o
emocional humano, como seres históricos, sociais, psicológicos, etc., marcando pela vida
afora aquelas pessoas de matrizes diferenciados dos brancos.
No entanto, a equidade no Brasil aparece como meta fundamental, como o direito “à
educação para todos”, deixando claro que, os discursos ideológicos podem convencer
qualquer pessoa que não compreenda esta realidade. Conseqüentemente, a educação escolar
sempre foi privilégio daqueles homens que a família apresentava poder aquisitivo elevado,
como os senhores de engenho, excluindo os africanos, negros, libertos e outros pobres,
deixando-os sem possibilidades até de compreender o seu mundo lá fora e aqui no Brasil.
Diante do exposto, a ideologia da superioridade e da inferioridade, separa
indistintamente homens brancos, como: os senhores, proprietários de bens necessários a
sobrevivência, na sociedade patriarcal escravista de produção, daqueles que deviam obedecer
e se subordinar a serem mão-de-obra barata, trabalhando na condição de homens
escravizados.
Após a abolição da escravatura quase nada mudou. A discriminação, o preconceito
ainda estão presentes no cotidiano do pobre, do negro e de todos aqueles que não conseguiram
atingir um patamar econômico relevante, próprio da sociedade de consumo, que perpetua

1 Professora Doutora do Curso de História e Pesquisadora.
2 Acadêmica do IV Semestre de História.
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padrões comportamentais que justificam o cotidiano de uma sociedade excludente e
preconceituosa.
Portanto, o estudo pretende mostrar a realidade vivida nas Escolas Básicas de
Santarém. Observar e analisar comportamentos preconceituosos e discriminatórios que geram
conflitos e problemas emocionais, contribuir com mudanças significativas na comunidade
escolar por meio das discussões com gestores, docentes, conselho escolar sobre os resultados
da investigação.

MATERIAL E MÉTODOS - A investigação está em processo. O levantamento
bibliográfico e a seleção desses documentos escritos, como livros, artigos tem permitido
condições da construção de um embasamento teórico que está possibilitando através das
análises a compreensão do objeto de estudo que é a educação afro-descendente nas escolas
básicas de Santarém.
Estas análises têm deixado claro que o negro escravizado se transformou em fonte de
renda, produtores de mercadorias e ao mesmo tempo poderiam ser mercadorias na sociedade
que estava se constituindo de características emergenciais, de um capitalismo agrário, de
modelo europeu luso, conservador, segundo os valores medievais em educação.
As discussões de Casaroto e Santos em seu artigo vêm mostrar a preocupação do
colonizador com os interesses agrários e comercializáveis lucrativos, deixando de lado a
educação escolar dos negros escravizados. Para eles, eram necessários, a educação prática:
trabalhar na agricultura, com o gado e a mineração. De acordo com Santos (2006, p.22):

A história narrada nas escolas é branca, a inteligência e a beleza mostrada pela
mídia também o são. Os fatos apresentados por todos na sociedade como se
houvesse uma preponderância absoluta, uma supremacia definitiva dos brancos
sobre os negros... Aliás, a palavra negro, além de designar o indivíduo deste grupo
étnico-racial, pode significar sujo, lúgubre, funesto, sinistro, maldito, perverso,
triste, nefando, etc
.

São tantos adjetivos discriminatórios, que se a maioria do segmento negro tivesse
clareza do significado, certamente já teria se rebelado. A sociedade brasileira só inclui negros
que tem destaque sócio-econômico, como: Pelé, o grande jogador do século XX. Ronaldo, o
Fenômeno. Para outros, as portas estão fechadas, como se não tivessem potencialidades a
serem desenvolvidas.

1 Acadêmico do II Semestre de História.
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Além dessa amostra de embasamento teórico, utilizamos como método de
abordagem o indutivo, a fim de irmos descobrindo através das observações diretas parte por
parte dos comportamentos existentes na comunidade escolar. O método histórico é de grande
significado e relevante para termos conhecimentos do passado dessa categoria social, que
tanto contribuiu com a sociedade brasileira e hoje continua presente através dos afrodescendentes
e todo um legado cultural histórico que se integrou a cultura brasileira.
O método comparativo permitirá condições de discutir comportamentos passados
com o presente, entrecruzando o histórico com o comparativo, para que possamos
compreender a educação atual dos afro-brasileiros.
Como técnica de pesquisa, a observação direta será importante, por verificar em
lócus como discentes, docentes se comportam um perante o outro. Por outro lado, é
importante observar quadro de avisos, cartazes, assim como se processam as aulas, se os
assuntos sobre África e afro-descendentes estão sendo enfatizados nas aulas.
A técnica da entrevista permitirá conhecer os discursos dos alunos e professores, o
que eles pensam sobre a Lei 10.639/03. Se estão estudando temáticas referentes a História da
cultura africana e afro-brasileiras. E também se os professores procuram incluir em suas
disciplinas assuntos pertinente aquilo que a Lei objetiva.
Após essa coleta de dados, faremos a catalogação dos discursos e das observações
para que tenhamos resultados condizentes aos objetivos propostos.

RESULTADOS E DISCUSSÕES
OS OLHARES DE 45 ALUNOS DE 7ª E 8ª SÉRIES NA ESCOLA BÁSICA - A pesquisa
está em processo, por isso seus resultados são parciais. Para constatar se os alunos gostam de
ler, perguntamos se eles freqüentavam a biblioteca da escola.
De modo geral, os discentes freqüentam pouco a biblioteca. Eles afirmaram numa
média de 80% que vão a este lugar obrigado, quando a professora manda e ameaça de ficarem
sem nota. 10% dos alunos consideram este local como algo que não tem nada interessante.
5% desse alunado não gostam da sala porque é fria, sem ambiente para estudar. Outros 5%
nunca entraram na biblioteca da escola, eles não gostam de ler.
Quisemos saber o que mais eles estudam sobre o africano no Brasil.
Uma parcela considerável disse que era a escravidão: os africanos nas fazendas de
café, nos engenhos, nas senzalas sendo explorados e oprimidos. Os negros também foram
encontrados nas minas de ouro e diamantes.
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Questionamos sobre o que esses alunos estudam sobre o continente africano. O que
mais surgiu em seus discursos foi sobre: o Egito e as Pirâmides, a pobreza do povo, a fome e
a miséria. Outro disse “que não entende porque lá só existe miséria”.
Perguntamos sobre atitudes comportamentais perante alunos de outra etnia. Em seus
discursos surgiram uma infinidade de apelidos, dos quais selecionamos alguns como: Fobó do
Laguinho, Cara de Lagartixa, Minhoca Loura, Formiga Atômica, Piolhenta, Boca de Caçapa,
Caolho, Tripa Seca, dentre outras.
Portanto, esses apelidos estão ocorrendo na sala de aula, que podem estar em nível de
preconceito entre alunos e vice-versa, como esclarece Amaral (1998, p.11):

Se pensássemos aos costumeiros apelidos que circulam nos lábios infantis: “rolha
de poço”, “azeitona no palito”, “pau-de-sebo”, “nanico”, “crioulo doido”,
“quatro olho”, “surdinho”, “tadinho”, “cegueta” “mula manca”... estaríamos
muito perto da resposta: a presença de preconceitos e a decorrente discriminação
vivida, ainda com mais intensidade... impedindo-os, muitas vezes de vivenciar não
só seus direitos de cidadãos, mas de vivenciar plenamente sua própria infância.

CONCLUSÃO - A escola é o pólo que reúne a diversidade étnico-cultural. As relações
sócio-educativas entre as pessoas da comunidade escolar devem permitir discussões abertas
sobre a forma de tratar o outro com respeito, valorizando-o como um ser pensante e com
potencialidades para criar e recriar o mundo.
Com isto, os dados até agora permitiram através das análises, descobrir que
propriamente a aplicação da Lei 10.639 ainda está para acontecer com veracidade e
cumprimento na comunidade escolar. Mas ela é um passo decisivo que deve ser colocado em
prática, embora se saiba que esta “lei é para toda a população brasileira, pois não somente
para negros”.
Neste caso, a orientação do Parecer 3/2004, apresenta os seguintes objetivos
aprofundando as discussões à respeito a Educação das Relações Étnico-raciais:

Divulgar é produzir conhecimentos, bem como atitudes, posturas e valores que
eduquem cidadãos quando a pluralidade étnico-racial, tornando-os capaz de
interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos
direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da
democracia brasileira.

Este parecer faz reflexões sobre a educação, onde a cidadania e a democracia devem
fazer parte do convívio humano. Mas ele vai mais além, quando se refere ao Ensino da
História e da cultura afro-brasileira e africana no que diz respeito:
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A reconhecer e valorizar a identidade, a história e a cultura dos afro-brasileiros,
bem como, garantir o reconhecimento e a igualdade de valorização das raízes
africanas na nação brasileira, ao lado das indígenas, européias e asiáticas.

Assim, a sociedade poderá incluir todos, sem exclusão de nenhuma pessoa, quando a
escola, família e outras instituições estiverem integradas tendo, a educação como base na
inclusão, cidadania e democracia em cumprimento a Lei 10.639/03 nas Escolas Básicas de
Santarém.

REFERÊNCIAS
AMARAL, Lígia Assumpção. Sobre Crocodilos e Avestruzes: falando de diferenças
físicas, preconceitos e sua superação, IN Julio Groppa Aquino (org). Diferenças e
Preconceito na Escola: Alternativas Teóricas e Práticas, 5 ed., São Paulo: SUMMUS,
1998.
CASAROTO, Karine e SANTOS, Adriana Regina de Jesus. UEL-UNOPAR. Algumas
Reflexões sobre o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (artigo),
Curitiba, 2006.
MUNANGA, Kabengele e GOMES, Nilma Lino. O Negro no Brasil de Hoje, São Paulo:
Global, 2006.
SANTOS, Hélio. História e Cultura afro-brasileira e africana: educando para as
relações étnico-raciais, Secretaria de Estado de Educação. Departamento de Ensino
Fundamental, Curitiba, 2006 – p.110 (caderno temático).

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